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 A última nota que aqui deixei foi uma peça sarcástica, quase um auto de comédia, na invocação da tradição da chamada literatura de cordel, recorrendo a anexins, para defender os visados de ficarem expostos.

De facto, a mim nunca ninguém me disse, oficial ou oficiosamente, quem eram os arqueólogos que lavraram um parecer acerca da ‘’colecção egípcia’’ do BPN. Ouvi uns zum zum, boatos, mas de facto não sei. De modo que os anexins Carlos Fabião e Jorge Oliveira, cabem a todos os arqueólogos, àqueles que foram incumbidos e aceitaram o encargo e aos que gostavam de o aceitar.

 

E não obtive qualquer resposta, até agora, a tudo o que aqui tenho trazido. Ou não há, ou, como se tornou hábito entre os portugueses, a resposta corre privada e em segredo, como corre o parecer.

 

Eu conheço muito bem os arqueólogos.Devem, sobretudo, alegar por aí que eu personalizei o assunto. Ora, o assunto tornou-se de facto, de certo modo, pessoal. Mas eu vou então demonstrar quem personalizou o assunto.

 

Para isso terei que traçar um perfil do itinerário da minha relação com os arqueólogos. E o leitor vai entender porque razão tudo vai parar ao BPN. Da mesma forma que, se pegarmos pelas pontas do BPN, tudo vai parar aos arqueólogos.

 

Vou iniciar com um tópico que talvez surpreenda o leitor.

 

Talvez ninguém o queira admitir, mas a verdade é que a entidade mais poderosa que intervém na administração das coisas arqueológicas, mais poderosa do que as instituições do estado que tutelam a arqueologia e o património arqueológico e do que as universidades, é uma SA. Isso mesmo, uma sociedade empresarial anónima.

 

Ao colocar a questão assim, eu não pretendo, de forma alguma, questionar qualquer empresa. E todos os arqueólogos já entenderam de qual falo, especificamente. A ERA SA foi a solução que, num dado contexto, que foi o da opção compartilhada da ideia de que o modelo de sustentabilidade da arqueologia num dado período de ilusão de crescimento era o modelo empresarial.

 

Todos os arqueólogos sabem que eu tive sempre grandes reservas relativamente a esse modelo e sempre o contestei. Muitos arqueólogos partilharam numa primeira fase as minhas reservas, a maioria rendeu-se à evidência de que as opções dos outros os ia encostando à inevitabilidade de conviver com o modelo, se quisessem ser arqueólogos, ou arqueólogos de uma dada maneira.

 

A minha contestação era bastante anterior, todavia, ao modelo. Porque havia um anterior, que tornou inevitável o posterior modelo empresarial.

 

O anterior era o da arqueologia de socorro. Durante talvez duas ou três décadas a arqueologia sobreviveu como intervenção de salvamento, sobre património arqueológico em risco.

 

Como, todavia, ainda não existiam empresas de arqueologia, era o estado quem subvencionava a arqueologia de socorro. A grande alteração de paradigma dá-se, em Portugal, na antecâmara das negociações para a adjudicação da execução do projecto do Alqueva.

Foi então que vi muitos colegas meus mudarem de atitude. Um deles, que nos fins da década de 1980 esgrimia bravamente contra as florestas industriais, nomeadamente contra as celuloses, viria a consagrar-se no âmbito e circunstância do Alqueva, mantendo-se todavia acantonado na arqueologia florestal, em alucinante disputa de território aos eucaliptos.

 

Houve mesmo bravos resistentes ao absurdo atentado do Côa que iriam mergulhar na arqueologia subaquática, na bacia hidrográfica de um Guadiana renovado.

 

Mas a minha posição foi-se mantendo incólume. Alegarão os arqueólogos que era fácil para mim. Eu não era arqueólogo, não precisava de escavar. Mas os senhores arqueólogos esquecem-se de que eu nunca precisei de escavar, mesmo quando fui arqueólogo e os arqueólogos precisavam de que eu assinasse uns papéis para eles escavarem, ou fazerem umas cartas arqueológicas, que foram sempre o pretexto para encontrar uns sítios moribundos para socorrer e escavar. Deixei sempre essa apetitosa actividade para os senhores arqueólogos.

 

Eu vou deixar aqui algumas ligações para o leitor se aperceber do nível dos arqueólogos. E dos argumentos que invocam para pedir à polícia que cale o Manel, porque o que o Manel diz nada tem que ver com arqueologia.

 

O Manel está hoje impedido de intervir no fórum Archport, no fórum MUSEUM e no fórum Histport. É fácil entender porquê. Os senhores arqueólogos podem agora lavrar um parecer sobre a ‘’colecção egípcia’’ do BPN, porque o Manel não pode responder. Os senhores museólogos podem promover a venda no estrangeiro de caquesseitões, porque o Manel não pode denunciar a tramóia das fidalguias que curam do nosso património.

 

Por isso foi fácil à Sociedade Lusa de Negócios contratar dois arqueólogos da primeira linha universitária para acusar um poeta comunista. E lavrarem um parecer, fazendo de contas que lavravam um parecer contra o Manel, que é um sujeito belicoso, que nunca entendeu os superiores interesses da economia e das finanças e que, para haver arqueologia, tem que haver obras. Para haver arqueologia tem que haver património arqueológico em risco.

 

O Carlos Fabião e o Jorge Oliveira são nesta novela apenas anexins. Os anexins de todos os arqueólogos.

 

 É por isso que não posso deixar de colocar aqui uma questão. Como cidadão tenho o direito de a colocar.

 

A SLN teve, em algum momento, comparticipação no capital social da ERA SA? Directamente ou por interpostos?

 

O contrato de adjudicação de um parecer aos arqueólogos que o lavraram, ou não, foi adjudicado pela ERA e transferido para os arqueólogos?

 

Porque razão os arqueólogos participaram numa das maiores farsas da história recente de Portugal?

 

Estavam em causa quatro mil e quinhentos milhões de Euros, até mais ver. E os arqueólogos bem sabiam que o sujeito activo da burla era o BPN e a SLN.

 

E resta-me dizer ao Carlos Fabião, com a franqueza que ele sempre me conheceu, que não precisava de calar o Manel para escavar e ser um dos dois herdeiros do direito incontestável de escavar na Lomba do Canho. Porque o Manel nunca teve nada que ver com o assunto. Escusava era de o fazer ofendendo o ‘’seu Mestre’’,  o Profesor João de Castro Nunes, em conluio com a Universidade de Coimbra e a Câmara PSD de Arganil.

 

O que quero dizer é que, enquanto as indústrias culturais navegarem de vento em popa, ninguém quererá saber em que sítio arqueológico ficaram enterrados quatro mil e quinhentos milhões de Euros.

 

 

 

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1 comentário

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De MCN a 23.09.2013 às 16:36

Em Portugal existem setecentas empresas de arqueologia, operando em vários domínios da actividade e com vários modelos orgânicos, desde empresas em nome individual a uma SA.

Se investigarmos quantos trabalhos, nomeadamente escavações ou actividades similares, como acompanhamentos de obras, decorrem hoje, ou decorriam ontem, ou há um mês, não decorrerão em simultâneo mais de 200 trabalhos.

Isto parece significar que haveria quinhentas empresas imobilizadas.

Ora, isso não corresponde à realidade.

Talvez fosse interessante saber quantas ‘’empreitadas’’ decorrem tituladas pela ERA SA. O que acontece é que existe um grande número, talvez 80% de empresas que na prática se limitam a fornecer às grandes empresas pessoal contratado por salários abaixo do salário mínimo, ou em regime precário com contratos à jorna.

São, na prática, empresas de trabalho temporário, como as que fornecem telefonistas aos ‘’call center’’ da PT.

Em regime de trabalho precário e em risco de criarem ‘’mau nome na praça’’, os assalariados arqueólogos têm receio de falar sobre o assunto.

Mas a verdade que todos tentam esconder é que encontram facilmente meios de reforçarem os seus rendimentos.

A realidade é esta. Nua e cruamente. O actual modelo empresarial da arqueologia só subsiste na condição de haver património em risco.

Muitos são os riscos que podemos presumir para o património.

Este é um dos factores que concorre para que os arqueólogos tenham que alegar que a ‘’colecção egípcia’’ do BPN é ‘’falsa’’.

Para mim a questão que subsiste é a de saber de onde surgiu. Se é inca, se é egípcia.

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