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O lado do Caso BPN que poucos conhecem nos seus trâmites mais profundos, obscurecidos pelos interesses das partes envolvidas. O relevo dado a duas colecções de arte entretanto sem paradeiro, fazendo crer que são motivo de todo o descalabro do caso BPN
‘’Um dos apoiantes de Carlos dos Santos Ferreira é António Mexia, presidente da EDP, que, segundo o ‘Jornal de Negócios’, convocou os accionistas de referência do maior banco privado português para uma reunião hoje, às 17h00, na sede da energética.
Santos Ferreira havia dito que não concorreria contra uma lista chefiada por Filipe Pinhal. Mas com a decisão de ontem do Banco de Portugal de inibir as candidaturas de todos os administradores do BCP que exerceram funções desde 1999 ao futuro conselho de administração do banco (abrangendo, entre outros, Miguel Cadilhe, João Talone e Pedro Líbano Monteiro), o presidente da CGD tem caminho aberto para mudar de instituição financeira.
A inibição segue-se a dois encontros que Vítor Constâncio teve com a actual administração do BCP e com os accionistas detentores de participações qualificadas, entre os quais Fernando Ulrich, António Mexia, Joe Berardo e Manuel Fino.
No fim do último encontro, realizado ontem, a instituição governada por Vítor Constâncio disse que com os citados accionistas debateu matérias “relacionadas com a assembleia geral convocada para 15 de Janeiro de 2008.”
As autoridades de supervisão estão preocupadas com uma eventual corrida aos depósitos por parte dos clientes do BCP.
A Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) revelou ontem ter encontrado “ilícitos criminais graves” na gestão do BCP, no âmbito de uma acção de supervisão que ainda prossegue. A CMVM investiga a natureza e a actividade de diversas entidades sediadas em jurisdições offshore responsáveis por investimentos em valores mobiliários emitidos pelo grupo BCP ou por sociedades com ele relacionadas. Calcula-se que o banco tenha concedido cerca de 700 milhões de euros de empréstimos para a compra de acções próprias.’’
Correio da Manhã, 22 de Dezembro de 2007.
Não deixaria de fazer sentido se entendêssemos este episódio como uma ‘’nacionalização’’ enfeitada. Se analisarmos com detalhe o que estava em causa quando Santos Ferreira foi convidado para substituir Filipe Pinhal na administração do BPN, a situação não andaria muito longe do que motivaria a nacionalização do BPN.
Tudo faz crer que Vítor Constâncio conseguiu, no caso do BCP, negociar uma solução alternativa e evitar a derrocada do banco.
Mas não deixa de ser notável que, por intervenção da supervisão, a CGD tenha sido chamada a intervir, com dois figurinos diferentes, em dois dos grandes bancos portugueses.
O estatuto que quero manter para esta sucessão de notas impede-me de especular sobre a ideia de que o PS de Sócrates tinha um programa de intervenção sobre a banca e que esse programa passava pelo reforço da posição da CGD e do seu corpo técnico no horizonte bancário português. Registemos pois, só, a similaridade das condições em que a supervisão é obrigada a intervir.
Na carta, a CMVM refere que as sociedades 'off-shore' referenciadas 'constituíram carteiras de valores mobiliários - integrando quase exclusivamente acções do grupo ‘’BCP', com financiamentos obtidos junto do próprio banco, 'não havendo, em regra, evidência de terem sido alimentadas para esse efeito por qualquer outra transferência significativa de entidade exterior ao Grupo'.
O regulador explica que 'as condições dos financiamentos em apreço e o modo de governação das entidades em causa indiciam que o BCP assumiu todo o risco dessas entidades 'off-shore' e que detinha poderes de domínio da vida e negócios dessas entidades', o que faz com que estas operações configurem, 'de facto, o financiamento da aquisição de acções próprias, não reportadas como tal'.’’
Se atentarmos nos nomes dos accionistas que apoiaram a candidatura de Santos Ferreira à administração do BCP em 2007, constamos que, no essencial, são os nomes dos accionistas que, em dado momento, tinham adquirido posições relevantes no capital social com suporte financeiro da Caixa Geral de Depósitos e que tinham sido drasticamente fustigados pela quebra súbito e linear das acções do BCP no mercado.
Configura-se pois uma situação em que a CGD, como o BPN e o BCP, financiavam grandes operações financeiras de aquisição de acções tomando como garantia os produtos de investimento do crédito concedido.
Do ponto de vista substancial, a diferença reside em que o crédito concedido pelo BPN destinava-se à aquisição de capital social das empresas da SLN ou que viriam a ser integradas no grupo. No caso do BCP, destinavam-se a ser investidas em capital social do próprio banco, que também não compreendemos como se distinguiria, do ponto de vista do seu objecto social, das empresas que alimentava.
Em nosso entender, o que estava em causa era a tipificação do objecto social de um banco e do objecto social de uma empresa financeira, ou de uma empresa sem perfil definido, mas que pode servir de filtro no circuito do capital, entre as entidades financeiras e as empresas ‘’produtivas’’ propriamente ditas.
Se observarmos com atenção para o que é hoje a GALILEI, a SLN sobrevivente ao abalo BPN, teremos muita dificuldade em tipificá-la. Tudo indica que é uma empresa de administração financeira, capaz de receber grandes blocos de financiamento estrutural e reparti-los por uma diversidade de intervenientes num programa de realização produtiva, mesmo que envolva muitos sectores e uma grande diversidade de procedimentos.
Dito isto, insistamos numa outra questão. Já chamámos a atenção para o facto de, logo após Miguel Cadilhe ter assumido a administração do BPN e anunciar o seu programa de solução estrutural para o problema, o Estado ter procedido ao levantamento de quinhentos mil Euros de uma conta aberta em nome do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social. Chamámos também a atenção para o facto de que essa quantia, nas circunstâncias em que se estimava o ‘’buraco’’ do banco em cerca de setecentos mil Euros, constituía o golpe de misericórdia sobre o BPN e a inviabilização de qualquer programa de recuperação.
Cabe aqui questionar, obviamente, o papel e o objecto social de uma entidade como essa, o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social. É um banco, uma empresa de especulação financeira? Que tipo de aplicações faz e pode fazer dos capitais que lhe são entregues para administrar? Notemos então também que o Fundo de Garantia da Caixa Nacional de Pensões perdera, durante os anos de 2010 e 2011, se as notícias divulgadas são claras, cerca de mil e Quinhentos milhões de Euros.
Note-se ainda que o valor de adjudicação da execução do Programa SIRESP pela SLN/SIRESP SA é de cerca de quinhentos milhões de Euros, valor que deverá ser pago até 2017, com a conclusão do programa. Todavia, a SLN estava, de acordo com os valores apurados pela PARVALOREM, em dívida de cerca de mil milhões de Euros ao BPN, de que só reconhece um pouco mais de quatrocentos milhões.
A PARVALOREM acorda com a SLN o pagamento de quatrocentos milhões e o restante é assumido pelo Estado. Mas o Estado mantém a adjudicação do SIRESP à SIRESP SA, cujo maior accionista é a SLN/GALILEI. Com que garantias? Que garantias apresentará a GALILEI no mercado para se financiar para a execução do programa? Os pagamentos do Estado? Os activos em posse da PARVALOREM?
Uma reportagem recente da SIC divulgou uma lista de devedores ao BPN. Para lá de pôr a tónica naquilo que nós já constatámos há muito, seja, que o BPN foi seccionado em dois, a residência dos activos e a residência dos passivos, a lista parece-nos absolutamente atabalhoada, porque, colocando a fasquia do ‘’buraco’’ em cerca de três mil milhões de Euros, nem consegue de longe perfazer esse valor. Por apurar fica sempre a dívida da SLN.
O que, para já, nos parece ser a mais óbvia consequência da nacionalização do BPN foi a consolidação da SLN, que mantém, consolida e estende os seus negócios, transmitindo a ideia de que a ruína do BPN não afectou a sua capacidade para se financiar no mercado.
O BCP perdeu a sua posição de liderança no mercado bancário em Portugal e não sabemos como a Caixa Geral de Depósitos, que financiou durante anos as aquisições de capital social do BCP, num jogo duro que manteve o valor das acções quando este já não correspondia a algo de real, conseguiu reaver os montantes desse financiamento. Talvez tenha aceite como quitação as acções cuja compra financiou e que eram a exclusiva garantia dos valores aplicados.
O programa do PS Sócrates parecia ser reforçar o papel da Caixa Geral de Depósitos no controlo de dois grandes bancos e assim reforçar a solidez da sua posição negocial nos mercados de crédito, para sustentar as necessidades de financiamento das parcerias público privadas.
Foi por isso que não nacionalizou a SLN nem nela interveio. Interessava que os valores em dívida da SLN ao BPN transitassem para a CGD, porque eram activos que a CGD poderia dar de garantia no mercado financeiro. Durante a primeira fase, foi assim que o passivo do BPN cresceu.
Há, sem dúvida, um programa político de expressão financeira por detrás da nacionalização do BPN e da intervenção da CGD no BCP. E não foi a crise, nem a presença da troika, que obrigou a coligação agora no governo a alterar o figurino.
Regressemos aos nomes que foram inibidos pela supervisão de se candidatarem em 2007 à administração do BCP. Está lá o Cadilhe. Está de novo na SLN.
Por detrás deste programa, andava também uma guerrilha surda entre os barões do PS e do PSD, envolvidos nos mesmos negócios.
BPN concedeu 135 milhões de crédito de risco quando já estava nacionalizado