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O lado do Caso BPN que poucos conhecem nos seus trâmites mais profundos, obscurecidos pelos interesses das partes envolvidas. O relevo dado a duas colecções de arte entretanto sem paradeiro, fazendo crer que são motivo de todo o descalabro do caso BPN
No dia 17 de Janeiro de 2014, amanhã, a Assembleia da República vai votar um projecto de resolução do Partido Socialista para obrigar o Governo a suspender a venda das obras de Joan Miró alegadamente provenientes do BPN e alegadamente pertencentes ao Estado.
Independentemente de tudo o que já alegámos para suspeitar de que a proveniência e a actual propriedade da colecção não é de forma alguma clara, ainda, adiante, retomaremos o assunto.
Registamos que hoje a ex-Ministra da Cultura Gabriela Canavilhas vem alegar uma nova perspectiva arteficiosa do problema. Sem dúvida relevante, é inesperado.
De acordo com as declarações de Gabriela Canavilhas, estaria por cumprir um requisito legal que por si, seria factor impeditivo da venda, as obras não estão inventariadas.
O facto de Gabriela Canavilhas, que terá acompanhado a questão entre 2009 e 2011 como Ministra da Cultura aparecer agora a levantar esta questão tem dois sinais.
O primeiro é a manifestação da maior das hipocrisias. Se a inventariação fosse uma imposição, se não legal pelo menos ética, perguntaria eu porque razão Gabriela Canavilhas não procedeu, durante dois anos, às diligências necessárias para que a colecção fosse inventariada.
O segundo é que, como temos sugerido ou alegado, a colecção não se encontrava formalmente inventariada em sede da tutela cultural e, ao que parece, Canavilhas, com a sua posição e o seu estatuto, não conhece ou suspeita não conhecer a composição da colecção.
Mas um terceiro ainda é que Canavilhas alega que corre um processo de inventariação associado a um processo de classificação.
Ora, que eu saiba, até Dezembro de 2013, quando foi anunciado que as pinturas estariam já em Londres, à guarda da Christie’s, só houve um pedido formal de classificação da colecção Miró e um requerimento explícito ao Secretário de Estado da Cultura para apurar o seu paradeiro. E foi da minha iniciativa, em Setembro de 2013, embora desde 2009 tenha sugerido continuamente que a colecção deveria ser classificada, a sua composição dada a conhecer aos portugueses, bem como o seu paradeiro.
Seja, a alegação e a forma como Canavilhas agora alega demonstram a mais vergonhosa das hipocrisias e falta de pudor.
Foi grave, porque ao dar assim o flanco, suscitou a resposta lesta do actual Secretário de Estado da Cultura, como era de esperar. Que vai parecer, agora, ter razão.
A proposta de resolução do PS acaba de ser derrotada por intervenção da ex-Ministra Canavilhas e vai apresentar-se perante a opinião pública como hipócrita e ridícula. Não podemos deixar de registar, de resto, a falta de pudor e a hipocrisia com que os assuntos relacionados com o património cultural são manipulados e jogados em Portugal na chicana política.
Durante o ano passado um outro episódio relacionado com a classificação de bens culturais fez correr rios de tinta. Uma pintura de Crivelli expedida por Pais do Amaral.
Na altura pusemos em destaqueo ridículo e a hipocrisia com que o assunto era abordado e deixámos bem claro que saía então a lume, como chicana política contra o então SEC, porque os antecedentes proprietários da pintura se sentiam lesados porque, antes de Pais do Amaral o conseguir, tinham tentado por todos os meios remover a classificação a que a pintura estava já sujeita, não tendo, todavia, os meios políticos e de pressão de que dispunha Pais do Amaral.
Mas o que é património cultural?
Porque razão uma pintura de Crivelli, ou um acervo de pinturas de Joan Miró, ou um tal Tintoretto de Singeverga, podem ou devem ser classificados como património cultural pelo estado português, património de quem, adstrito a quem?
Insolitamente ninguém alega que a colecção Miró não necessita de classificação alguma para que os portugueses questionem se é legítimo ou oportuno vendê-la. Ela é propriedade do Estado português, se não têm andado a entreter-nos com uma torpe mentira.
A questão será a de saber se é culturalmente relevante conservar na posse do Estado e na fruição dos portugueses uma colecção de pinturas de Joan Miró. Se é financeiramente relevante vendê-la pelos valores em expectativa, tendo em conta os custos que o Estado já assumiu.
Ora, para lá de outras, foi a essas questões que o estado, no âmbito de decisões arbitrárias e conspirativas, nunca quis partilhar com os portugueses nem com os seus parceiros.
Mas nós já explicámos porquê e, não tendo sido rebatidos, permanecemos na convicção da razão.
O Estado português nunca partilhou as suas decisões acerca da colecção Miró com os portugueses porque esteve sempre a mentir no que respeita à verdadeira dimensão do caso BPN, da propriedade da colecção, do seu paradeiro e da plataforma de conspiratividade do governo com a GALILEI. Por isso não partilha com os portugueses muitos outros segredos que partilha com a GALILEI, como sejam a venda do BPN e a real dimensão dos créditos concedidos pelo BPN à GALILEI, dos prazos de execução desses créditos e do estado das garantias.
O Estado limitou-se a lançar o ‘’bolo’’ BPN em défice público. Agora usufrui dos negócios com os ditos ‘’activos’’. É por isso que a colecção Miró é meramente um activo.
E fica para a ex-Ministra Canavilhas a seguinte questão:
A Senhora Deputada empreendeu alguma diligência, enquanto foi Ministra, para proceder ao inventário ou assegurar o paradeiro de uma tal ‘’colecção egípcia’’, alegadamente, na opinião de alguns, falsa, mas que, se por mero acaso não for falsa, seria também propriedade do Estado e por isso devia ser inventariada e colocada a resguardo?
A quem não interessou, igualmente, que a ‘’colecção egípcia’’ não fosse imediatamente inventariada, colocada a recato e à guarda de uma instituição da tutela, para que o seu paradeiro se pudesse perder?