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Eu vou nesta nota ‘’chamar os bois pelos seus nomes’’. Estou farto e perdi a paciência.

Todos os meus amigos, docentes e discentes, sabem que, cá para nós, eu sou o Manel.

Estou farto de ser citado por procuradores, polícias e jornalistas como ‘’o Castro Nunes’’ ou ‘’o Manuel Castro Nunes’’ e eu a dirigir-me a Suas Senhorias por ‘’sua Excelência o Senhor Procurador’’, ‘’Excelentíssimo Senhor Inspector RG’’, ou ‘’DL’’. Excelentíssimo Senhor Director do Diário de Notícias’’, ‘’Excelentíssimo Senhor Sub-Director Geral dos Serviços Prisionais, ex Licínio Lima, Diário de Notícias’’.

Pois o raio que vos parta, para recorrer a linguagem moderada, não vá o município de Arganil dar-se por ofendido.

 

Nesta nota vou dirigir-me ao Jorge Teixeira, ao Rui Girão, ao João Oliveira, a par com o Sérgio Azenha e com a Débora Carvalho.

Como cidadão republicano, eu tenho o dever de me apresentar, em julgamento e fora dele, em pé de igualdade com os meus acusadores. E de discorrer sobre os seus propósitos como ele discorreram antecipadamente sobre os meus. Sobretudo quando os seus são tão óbvios. E quem acusa sou eu.

 

Acuso o Jorge Teixeira, Procurador da República e nessa condição e circunstância acusador no Processo 91/09.9JDLASB, de construir, com fins obviamente mediáticos e lesivos da reputação e bom nome dos acusados, com claros propósitos políticos adiante analisados, uma acusação fundamentada em juízos subjectivos e conjecturas vãs sem qualquer suporte na documentação recolhida no âmbito da investigação, toda ela suportada em proposições desta natureza:

 

‘’361º - Os arguidos Joaquim Pessoa e Manuel Castro Nunes tinham consciência que as peças que acabaram por ser vendidas à GESLUSA constituem um ‘’conjunto sem qualquer valor histórico-arqueológico, correspondendo a cópias de má qualidade  de artefactos existentes e, na maior parte, a produções imaginadas sob influência de iconografias antigas’’."

 

Ora, a citação entre aspas foi extraída do relatório de peritagem de quatro páginas subscrito por três arqueólogos, a única prova pericial constante num processo com mais de duas mil páginas que alega ter sido proferido com base na observação presencial da colecção. O Jorge Teixeira nada saberá de arqueologia, mas tem o dever de saber distinguir e reconhecer os requisitos para um relatório pericial válido e consistente.

 

Mas o mais grave é que não consta em todo o Processo um único documento que possa demonstrar o estado de consciência dos arguidos, nem uma só manifestação própria ou alheia que demonstre do que estavam convictos ou conscientes. As poucas que poderão em sede de julgamento ser invocadas demonstram o contrário.

A sequência narrativa do Jorge Teixeira parece ter para mais o propósito de propor que os arguidos conheciam, em 2005, o teor do relatório da comissão de peritagem, antecipando a sua consciência e convicção.

 

No Artigo 362º, o Jorge Teixeira escreve:

‘’Não obstante tal conhecimento sobre a natureza das peças, os arguidos Joaquim Pessoa e Manuel Castro Nunes forjaram a produção dos designados verbetes de achamento, que forneceram ao Grupo BPN/SLN, pretendendo fazer constar que sabiam não corresponderem à realidade, de forma a induzirem, em erro, terceiros sobre a origem das peças.’’

 

O Jorge Teixeira deduz o alegado de um inepto relatório do Laboratório da Polícia Judiciária que conclui literalmente que os verbetes ‘’podem ter sido escritos todos na mesma máquina’’ que usaria o modo de escrita ELITE. Tendo a Polícia Judiciária apreendido uma máquina de escrever da marca ELITE a um tal Gueifão Ferreira, o Jorge Teixeira deduz, sem mais, que o Joaquim Pessoa e o Manuel Castro Nunes escreveram os ditos verbetes naquela máquina, não constando no Processo qualquer diligência de prova de que a máquina de escrever do Ferreira poderia ter escrito os verbetes.

 

O Jorge Teixeira sabia também, ou tinha a obrigação de saber que os peritos laboratoriais da Polícia Judiciária não estavam a ‘’descobrir a pólvora sem fumo’’ quando constatavam que os verbetes foram todos escritos na mesma máquina de escrever, ou em duas, ou três, todas, porventura, utilizando a mesma variante de escrita, que não é seguramente a variante de escrita ELITE. Era já bem claro, em toda a documentação que em devido tempo produzimos, no decurso das nossas investigações, que os verbetes, pelo menos aqueles que foram sujeitos a perícia policial, foram todos escritos por dois sujeitos que recolhiam informação de várias fontes, na maior parte manuscrita, por encargo ou patrocinados por alguém que teria no início da década de 1940 reunido uma vasta colecção. Era também óbvio que as informações que recolhiam tinham sido produzidas em variados contextos, mais ou menos esclarecidos ou conjecturais, mais próximos ou mais distantes do contexto de achamento. E que havia que proceder a uma cuidada hermenêutica para encontrar o seu sentido e determinar a sua relevância. E que eu, pessoalmente, atribuí sempre predominância, para efeitos de avaliar a sua genuinidade, aos artefactos em si, considerando os verbetes documentos complementares que necessitariam de uma abordagem específica mas nunca determinante.

 

Ora, o Jorge Teixeira conhece o meu currículo sumário e nele constam dados que atestam que me devia considerar um perito documentalista.

Mas para o Jorge Teixeira e para os investigadores eu sou o Manuel Castro Nunes, nem arqueólogo nem nada.

 

Qual o propósito de uma Acusação deste calibre, toda ela projectada sobre conjecturas que serão desmanteladas quando, em sede de julgamento, forem confrontadas com a documentação constante do Processo?

 

Como irei demonstrar, o propósito é intervir, num dado contexto político, junto da comunicação social, tentando, entre outros fins, iludir o facto incontornável de a colecção vendida por Joaquim Pessoa à GESLUSA não ter paradeiro.

 

Vou introduzir neste passo da minha acusação uma breve reflexão.

 

O sistema judicial português continua a sobreviver couraçado pela armadura corporativa que herdou do estado salazarista. Os portugueses continuam todavia a tentar oportunistamente sobreviver e conviver com um sistema judicial cujos procedimentos correntes sabem estar acima do seu entendimento, cultivando uma espécie de pavor e ovacionando as mediáticas figuras dos super magistrados.

O juiz Rui Teixeira notabilizou-se, ovacionado por quase unanimidade, ao decretar que no seu tribunal o acordo ortográfico estava excluído e recusando a aceitação de um relatório de um recluso escrito segundo as normas do acordo ortográfico.

O Rui Teixeira tem todo o direito de contestar a lei nos lugares próprios no uso dos seus direitos de cidadania, mas ao recusar o cumprimento da lei coloca-se à margem do estado de direito que jurou respeitar e defender, tornando-se um fora da lei. Mas o juiz Rui Teixeira é um super magistrado, como o Carlos Alexandre.

 

Os portugueses, no exercício dos hábitos oportunistas e servis que a inamovível cultura salazarista disseminou entre eles e cuja reprodução é garantida por todas as cadeias institucionais de transmissão cultural, da escola à universidade, da taberna ao parlamento, vão sussurrando que o sistema judicial é corrupto e partilha com as instituições do poder político e financeiro os benefícios da corrupção. Por isso, ovacionam os super magistrados e os seus procedimentos fora da lei, atribuindo-lhes poderes ilimitados.

Os super magistrados são os mais políticos agentes do poder político dentro do sistema judicial. Só assim alcançam cobertura para os seus super poderes.

Ora, o sistema judicial não é apenas um segmento do aparelho político do Estado, é talvez um dos seus componentes estratégicos. A ideia de que no sistema judicial existe uma plataforma elevada da hierarquia que se mantém isenta e é por isso o garante da imparcialidade e neutralidade da lei é uma ideia que entronca no pensamento corporativo salazarista, que propunha de resto todo o aparelho, com a sua cadeia de corporações transmissoras, como uma entidade acima do arbítrio da lei e da ordem republicana. A ideia de um super magistrado entronca na ideia do ‘’estado de excepção’’ e de que, ao promover super magistrados e concentrar poderes nas suas mãos o Estado está a promover a idoneidade e a isenção.

Mas as próprias leis não são isentas, são o resultado do equilíbrio ou desequilíbrio de forças num dado momento e circunstância.

 

Bem, mas aquilo a que queria mesmo dar ênfase era ao papel dos advogados, como corporação, na sustentabilidade do sistema.

Marinho Pinto é hoje quase um herói nacional porque conquistou a adesão da ordem, ao tornar-se num dos mais diligentes bastonários na defesa dos privilégios e do âmbito da exclusividade em todo o processo judicial.

Os portugueses podem ser cada mais néscios em questões de direito, porque, uma vez que integra a advocacia, o sistema dispensa a intervenção do cidadão na defesa dos seus direitos, barrando-lhe progressivamente o acesso ao exercício da sua iniciativa no âmbito do processo judicial, seja do foro criminal ou cível.

Aos cidadãos resta um rincão cada vez mais acanhado de iniciativa forense.

 

Eu, pessoalmente, invoco o meu direito a intervir decisivamente na minha defesa e de ser reconhecido como parte activa em todas as diligências processuais e de ser tratado a par com os meus opositores, mesmo que sejam os mais super procuradores ou juízes.

E se eles, à boa maneira republicana, me tratarem por tu, eu tratá-los-ei por tu.

 

(CONTINUA)

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1 comentário

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De olivetti a 26.07.2014 às 14:57

O recurso do procurador à cedência de informação a jornalistas reles só comprova por um lado o quanto os consegue manipular (tristeza! ) e por outro o desespero aparente do próprio Jorge Teixeira para destruir a honra de arguidos que ainda nem foram a julgamento. É da maior baixeza. Da parte de um magistrado isto é muito preocupante.

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