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O juiz teve nesse dia um almoço improvisado de sanduíches e sumos, juntamente com o procurador Rosário Teixeira e o representante da Ordem dos Advogados, Pedro Raposo, pago por Abel Pinheiro que ainda não sabia que ia ser detido para interrogatório. A refeição caiu-lhe mal, mas não era a primeira vez que isso acontecia.

(...)

Em 2001, estava então na PJM, resolveu fazer uma proposta no Clube de Tiro de Monsanto: na presença dos directores da PJM, Governo Maia, Alcino Roque, e de colegas magistrados, como Artur Vargues, disse que o próximo almoço era por conta dele e que seria no restaurante A Maria, no Alandroal, a terra alentejana da mulher, onde tem várias casas de família. Em Junho juntaram-se, mas eram em número muito superior ao previsto. Carlos Alexandre começou a fazer contas quando percebeu que havia convidados de convidados. Já quase no fim do almoço, e quando reparou que o whisky circulava, saiu rapidamente da mesa para pedir a conta, colocando um travão à despesa. A gerência do restaurante descansou-o – o director da PJM, Governo Maia, já tinha mandado tratar do assunto. E os quase 1.115 euros passaram a despesas de representação da Judiciária Militar.

 

Este episódio é transcrito de um artigo do jornalista da revista SÁBADO, encomiástico, em que António José Vilela tenta trazer à ribalta o Juiz Carlos Alexandre, colocando em destaque as mais notáveis particularidades do seu temperamento, que supre sem desvantagens o facto de ‘’nunca ter sido um aluno brilhante’’. António José Vilela tem angariado uma inesperada notabilidade através de uma actividade jornalista populista, demagógica, que só encontra audição na presunção de um público culturalmente deficiente. Através de múltiplas intervenções AJ Vilela já teria arruinado a reputação de Carlos Alexandre se os portugueses tivessem sido habilitados com uma cultura cidadã aceitável.

Para António José Vilela, a rigorosa avaliação da competência do super juiz é irrelevante face ao vigor espontâneo da avaliação do seu carácter por conterrâneos e vizinhos:

 

Não é fácil encontrar aqui quem não goste do Carlos Alexandre. E se souberem de alguém, digam-me, que vou lá eu próprio enxovalhar essa pessoa, diz à SÁBADO João Baço, proprietário do café A Carruagem, em Mação. Elisa Pólvora, a antiga professora de Alexandre, hoje com 86 anos, destaca-lhe o bom carácter que já se via em miúdo.

 

O homem que é hoje responsável por 200 processos-crime nunca teve uma vida fácil. Foi a carregar baldes de cimento que ajudou o pai a construir a casa da família, uma moradia localizada próximo do quartel da GNR. Entre Junho e Dezembro de 1975, ele e o pai deram-lhe a forma, mas não o aspecto limpinho que hoje tem. Carlos Alexandre tinha 14 anos, estava no 8.º ano e era notória a inclinação para os estudos. Muito novo, ainda foi para Abrantes, onde o irmão mais velho passou a viver, para frequentar o 5.º ano, mas quando a telescola chegou a Mação regressou a casa dos pais. Foi pela televisão que fez o 5.º e o 6.º ano.

 

Em 1972, voltou à escola e foi aí que chorou como um perdido, conforme lembra à SÁBADO o professor Pomba Marques: a colega Jeninha levava-lhe a melhor nas provas de Matemática. Quando a superou num exame final, “deu saltos de alegria”, diz o antigo professor. Ainda assim, Alexandre tinha era inclinação para as letras – as notas melhores eram a Português, História, Francês e Inglês. Hoje, ainda tem uma letra de mestre-escola, como se vê nos despachos e acórdãos que insiste em escrever à mão. Usa pouco os computadores e é também um orgulhoso iletrado a lidar com a maquinaria doméstica, fogão incluído.

 

É oportuno que faça neste ponto uma declaração de princípio. Pessoalmente, eu invisto muito mais da minha diligência cidadã, na defesa dos princípios que orientam a minha cidadania e as minhas orientações ideológicas, em denunciar atitudes, práticas institucionais e colectivas, ou singulares quando respeitam a flagrantes abusos de sujeitos singulares. Tento, para mais, distinguir-me dos meus patrícios por não embarcar nas atitudes persecutórias em que acabam por se degradar de forma vil, em Portugal, a maioria das denúncias ou meramente das ‘’discrepâncias’’ políticas. Sou intensamente criticado pelos meus ‘’correlegionários’’ por não embarcar em ‘’fulanizações’’ e maiormente por me negar a requerer a mobilização leviana da justiça ou do aparato do poder judicial para sancionar opções ou atitudes que, em princípio, são políticas e só com toda a prudência podem ou devem ser transferidas para o foro criminal ou mesmo pessoal. Penso, para mais, que só desta forma podemos assumir, em toda a sua complexidade e até às derradeiras consequências, os princípios constitucionais e civilizacionais de separação dos poderes e do seu âmbito de intervenção.

 

Se ataco agora sem inibição o Juiz Carlos Alexandre é porque ele é, consentidamente ou por iniciativa própria, e quis ser um super magistrado. É obviamente irrelevante denunciar um regime autocrata sem nomear o autocrata. Como o autocrata, um super magistrado é um sujeito singular, que pretende fazer sobrepor o seu carácter ou temperamento à lei e às instituições. Como já disse, um super magistrado é aquele que arruína a legitimidade de toda a magistratura.

 

Mais de duas semanas após o Juiz Carlos Alexandre ter despachado a prisão preventiva de José Sócrates, o jornalista Carlos Rodrigues Lima, do Diário de Notícias, que alega ter tido acesso ao Despacho de 200 páginas e que se notabilizou com o seu espírito persecutório a José Sócrates e que difundiu, de livre vontade e com toda a bacoca segurança, os tópicos de acusação que a comunicação social tem acometido às intenções do Procurador Rosário Teixeira e do Juiz Carlos Alexandre, publica um artigo inesperado e insólito. No entender de Carlos Rodrigues Lima, que teve acesso ao Despacho do Juiz Carlos Alexandre que decreta a prisão preventiva de José Sócrates, os fundamentos que ditaram ao juiz a inevitabilidade da medida de coacção não passam de conjecturas sem qualquer solidez documental, fundamentadas no princípio de que não há almoços grátis.

 

Seria legítimo que nos interrogássemos sobre que ónus recaíu sobre o Juiz Carlos Alexandre em virtude da liberalidade do Director da Polícia Judiciária Militar, ao pagar a factura de um almoço para que o super juiz convidara os seus amigos pessoais, sabendo que o juiz era o intermediário da solução de um aceso contencioso entre Governo Maia e Alcino Roque, mutuamente acusados de corrupção?

 

Claro que não. Com a referência a este episódio pretendo apenas ressalvar a cultura rasteira e bacoca que grassa nos meios jornalísticos. Quando António José Vilela, há alguns meses, revelou o episódio do jantar em Alandroal, sabia já que as suspeitas dos super magistrados relativamente a José Sócrates se fundamentavam na conjectura de que ‘’não há almoços grátis’’.

Os meios de comunicação desmantelaram a dignidade e a reputação dos super magistrados. Mas isso é lá com eles e entre eles.

Carlos Rodrigues Lima sintetiza desta forma o fundamento da decisão de Carlos Alexandre:

 

Certo é que nas mais de 200 páginas do despacho que encerrou os interrogatórios dos arguidos, não é feita referência ou indicação a qualquer ato concreto de José Sócrates enquanto primeiro-ministro que poderá ter beneficiado o grupo Lena, do qual Santos Silva foi administrador, já que, segundo o Ministério Público, terá sido daquele grupo a origem de grande parte dos 23 milhões de euros depositados na Suíça em nome de Carlos Santos Silva, mas que o procurador Rosário Teixeira considera ser José Sócrates o verdadeiro dono do montante.

 

E ainda:

 

No despacho que colocou os três arguidos em prisão preventiva, o juiz Carlos Alexandre afirmou que tanta generosidade, sem contrapartidas, não encaixava no seu "humilde espírito".

 

Temos agora a confirmação do que já era óbvio. O Juiz Carlos Alexandre atirou para os calabouços o ex-primeiro ministro com base numa conjectura.

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 ‘’(…) as pessoas têm que confiar nos juízes por isso, porque têm o poder de prender (…)’’ alega o Presidente da Associação Sindical dos Juízes Portuguesas numa recente entrevista ao ECNÓMICO, em abono de Carlos Alexandre.

 

Eu não quero confiar nos juízes porque eles têm o PODER de prender. O mero facto de o Presidente da Associação Sindical dos Juizes Portugueses alegar em abono do Juiz Carlos Alexandre que ele tem o poder de prender e por essa razão ‘’as pessoas’’ têm que confiar nele denuncia um espírito, uma cultura e uma convicção alarmante transversal a toda a corporação.

 

Atirar com um sujeito para os calabouços sem indícios documentados muito sólidos, recorrendo meramente ao PODER e à conjectura, é muito grave. Na verdade, é criminoso.

 

O caso de José Sócrates deve suscitar por parte dos portugueses uma firme rejeição e a exigência de profundas reflexões sobre o âmbito e a legitimidade do poder judicial e dos magistrados singularmente.

 

Eu, pessoalmente, não aceito um super magistrado nem aceitarei nunca ser julgado por um super magistrado. Porque um super magistrado é, por definição, alguém que se assume como excepção no âmbito do estado de direito e recorre ao PODER onde a legitimidade falhe. Ao PODER ou à coragem, como se tornou hábito alegar.

Se eu fosse um super magistrado, também não me faltaria coragem.

Mas não sou.

Relacionados:

Clonar os super magistrados

. Caso Sócrates: afinal a Justiça é manipulável pela política

. Eu e José Sócrates. Nota explicativa.

Agora quem acusa sou eu

. Correio da Manhã: O Robin dos Bosques do Campus Justitiae

 

 

 

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5 comentários

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De .. a 16.12.2014 às 16:11

Bem haja pela sua visita e pelo excelente artigo, bem como por todo o blog que visitarei com gosto e se me autoriza, passarei a seguir. Um bom resto de semana, grata mais uma vez por me ter direccionado para aqui.
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De MCN a 16.12.2014 às 19:20

Obrigado nós pela sua visita, Maria de Fátima Soares. E agradecemos sempre que deixe a sua opinião sobre o que publicamos e que seja rigorosa de forma a contribuir para que melhoremos ou corrijamos quando for o caso. Uma boa semana também

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