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O lado do Caso BPN que poucos conhecem nos seus trâmites mais profundos, obscurecidos pelos interesses das partes envolvidas. O relevo dado a duas colecções de arte entretanto sem paradeiro, fazendo crer que são motivo de todo o descalabro do caso BPN
Temos sido desde há cerca de um mês e meio, após a publicação da nota ‘’Alguém investiga a PARVALOREM? - Carta aberta à oposição’’, em 24 de Fevereiro, interpelados por um leitor que nos tem colocado algumas questões, que, do nosso ponto de vista, transmitem a ideia de que a hecatombe de desinformação que desabou e desaba permanentemente sobre tudo o que respeita ao ‘’caso BPN’’ impede por vezes a percepção de coisas elementares.
No caso em referência, embora outras questões também tenham sido levantadas pelo leitor, que nos parece muito empenhado em transmitir-nos factos aparentemente inéditos, para veicular uma certa percepção de várias questões, nomeadamente sobre as razões porque a estrutura orgânica do BPN se manteve incólume, com administração autónoma das suas múltiplas participadas, como a BPN Crédito e o Banco EFISA e sobre o papel destas participadas no descalabro crescente após a nacionalização.
Ora, primeiro que tudo devemos notar que a sobrevivência das participadas sob administração autónoma permite ao actual Presidente da Administração de PARVALOREM manter os cargos de Presidente da Administração de cada uma das antigas participadas da BPN SGPS, com a consequente acumulação de alcavalas, o que seria, só por si, uma razão de peso. Para lá disso, foi essa alegada autonomia que tem dado suporte à transacção de activos e passivos entre todas as participadas, nomeadamente a aquisição, por parte de PARVALOREM, de todos os activos ‘’tóxicos’’ das restantes participadas da antiga BPN SGPS, dando curso ao ‘’branqueamento’’ destas e à cumulativa ‘’intoxicação’’ daquela.
O que temos feito, de facto, tem sido, em grande parte, interrogar esta orientação ou estratégia alegadamente financeira.
Ora, devemos para já manifestar aqui uma surpresa. Ao apresentar-se como Presidente do Conselho de Administração da PARVALOREM e de todas as antigas participadas da antiga BPN SGPS, Nogueira Leite está a replicar um tenebroso estatuto que foi a origem e a razão das primeiras interpelações do Banco de Portugal a Oliveira e Costa, quando assinalava que a ausência de autonomia administrativa das sociedade do GRUPO SLN dificultava, em sede de contabilidade, uma rigorosa supervisão.
Mas, para cúmulo, alternando apenas a posição com o vogal do Conselho de Administração de PARVALOREM, Bruno de Castro Henriques, Nogueira Leite é ainda um dos dois membros do Conselho de Administração de PARPARTICIPADAS SGPS. Esperamos que se entenda o significado deste detalhe.
Devemos todavia notar desde já que este ‘’império’’ foi herdado por Nogueira Leite da anterior orientação de Francisco Bandeira, que acumulava já a presidência dos conselhos de administração dos veículos com a das participadas.
No Relatório de Contas do Banco EFISA para o exercício de 2010, o então Presidente do Conselho de Administração, Francisco Bandeira, escreve em Mensagem introdutória:
‘’Por outro lado, no quadro da reprivatização do BPN, em conformidade com o referido no Decreto-Lei nº 2/2010, foi definido pela Secretaria de Estado do Tesouro e Finanças, um conjunto de medidas, nomeadamente a segregação de um conjunto de activos do Balanço do BPN consolidado. Para o efeito, foram constituídas três sociedades anónimas, denominadas Parvalorem, S. A., Parups, S.A. e Parparticipadas, SGPS, S.A., detidas, na totalidade, pelo BPN e para as quais foi transferido um conjunto de activos que, em 30 de Novembro de 2010, se encontravam registados nos balanços das empresas do grupo BPN.
Assim, a sociedade Parvalorem, S.A. adquiriu, ao valor nominal, créditos sobre clientes da carteira do Banco Efisa e a sociedade Parups, S.A adquiriu títulos, imóveis recebidos em dação em cumprimento ou adquiridos em processos judiciais de recuperação e participações em empresas que integravam o activo do Banco.
A sociedade Parparticipadas SGPS, S.A. adquiriu as participações sociais que o BPN detinha directa ou indirectamente em empresas do Grupo. Assim,. a participação que a BPN - Participações Financeiras, SGPS, Limitada detinha no Banco Efisa foi adquirida por aquela empresa.
Estas operações permitiram que os capitais próprios do Banco Efisa evoluíssem de um valor negativo de 83,1 milhões de euros em 31.12.09 para um valor também negativo de 1,9 milhões de euros em 31.12.10.’’
A referência a este procedimento ‘’estratégico’’ será retomada nas notas introdutórias aos relatórios de contas dos exercícios posteriores, até 2012, que é o último divulgado, no caso já por Nogueira Leite.
O que daqui se deduz é que, entre a PARVALOREM e a PARPARTICIPADAS SGPS, todos os ditos activos ‘’tóxicos’’ alojados em sociedades participadas da antiga BPN SGPS foram sangradas, deixando a estas apenas - como de resto reconhece o leitor que nos interpela e parece interpelar-nos em nome dos trabalhadores e colaboradores de BPN Crédito - os activos ‘’lucrativos’’.
Notemos também, desde já, que a maior parte destes créditos adquiridos pela PARVALOREM, eram créditos concedidos à SLN ou a sociedades do grupo SLN ou maioritariamente participadas pela SLN. A PARUPS, por sua vez, adquiria títulos, imóveis dados em pagamento ou adquiridos em processos judiciais (executados) e participações em sociedades.
Ora, em causa está o cálculo dos montantes de todos estes activos ‘’tóxicos’’ adquiridos pelos denominados ‘’veículos estatais’’ às participadas, a sua gestão, a real situação contabilística desse ‘’património’’ e a compreensão da justificação de todos os valores de cálculo das perdas por imparidade, para dar suporte a montantes de crédito acrescido adquiridos por PARVALOREM no mercado, directo e indirecto, nomeadamente obrigacionista.
Vamos neste passo inserir uma resposta que demos ao nosso leitor acerca da questão específica das emissões de cerca de quatro mil milhões de Euros em papel comercial publicitadas pelo BPN primeiro e depois por PARVALOREM.
‘’Tentativa de compreensão do destino e alojamento contabilístico dos valores resultantes da emissão de papel comercial por PARVALOREM, em 2011, 2012 e 2013, confrontando os respectivos Relatórios de Contas com os documentos de emissão.
http://web3.cmvm.pt/sdi2004/emitentes/docs/fsd26133.pdf
http://web3.cmvm.pt/sdi2004/emitentes/docs/fsd27668.pdf
http://web3.cmvm.pt/sdi2004/emitentes/docs/fsd29213.pdf
As ligações acima respeitam às ‘’notas informativas’’ emitidas ‘’online’’ por PARVALOREM para apresentação dos programas de emissão de papel comercial em 2012 e 2013. Uma emissão em 2012 e duas em 2013.
A PARVALOREM havia já realizado uma emissão em 2011 e o BPN, antes da incorporação em PARVALOREM, realizara uma em 2010. Cada uma no montante de mil milhões de Euros.
Relatório de auditoria nº 32/2011- 2ºS
A questão está em tentar entender o propósito destas emissões e destas necessidades de financiamento e saber se a sua aplicação em gestão corrente está expressa e de que forma nos respectivos relatórios de contas de PARVALOREM.
Para formularmos uma ideia o mais aproximada possível da forma como a informação impede sucessivamente a compreensão clara desta matéria, reproduzimos uma notícia divulgada na página online do Banco Carregosa, Go Bulling, em que se anuncia a emissão de Dezembro de 2013:
‘’A Parvalorem vai financiar-se em 500 milhões de euros, depois de uma emissão de papel comercial, que será subscrita pela CGD, de acordo com o comunicado emitido para a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).
Esta emissão, que será realizada sexta-feira, 27 de Dezembro, é garantida pelo Estado no “âmbito da nacionalização do Banco Português de Negócios”.
O juro foi estipulado em 2,142%, sendo que o reembolso deverá ocorrer a 27 de Junho do próximo ano.
Esta emissão não deverá ser alheia ao facto da Parvalorem ser um dos veículos usados na nacionalização do BPN e cujos empréstimos terão de ser pagos, de acordo com as regras estipuladas pela troika.
No final de Junho de 2013, os veículos Parvalorem, Parups e Participações tinham junto da CGD dívidas no valor total de cerca de 31 mil milhões de euros.
Ainda no relatório da oitava e nona avaliações do programa de ajustamento, a troika reiterou que a CGD teria de ser ressarcida dos empréstimos aos veículos que ficaram com os activos problemáticos do BPN à medida que estes foram gerando proveitos.’’
De notar que o relatório da Oitava Avaliação do Programa de Assistência Financeira estipula a conclusão do Programa como o prazo para o Estado Português, como garante de PARVALOREM, liquidar junto da CGD todos os valores dos financiamentos concedidos pela CGD ao BPN/PARVALOREM. Enquanto que o papel comercial foi emitido a cinco e dez anos.
Imaginemos de qualquer modo que o Estado Português terá que devolver à CGD os alegados trinta e um milhões de Euros em dívida até ao mês de Julho próximo.
Passemos pois em claro o montante sugerido para o total da dívida do conjunto das três participadas à CGD, seja trinta e um mil milhões de Euros, chamando todavia a atenção para que, se tal montante estivesse a ser omitido por trás dos números até agora projectados para os finais de 2019, a dimensão da tragédia seria catastrófica.
Vamos então primeiro que tudo tratar de distinguir a natureza das obrigações de crédito contraído directamente pelo BPN e depois por PARVALOREM junto da CGD, as tais que pressupostamente rondariam os trinta e um mil milhões, das emissões de papel comerciais que a Caixa Geral de Depósitos subscreveu nestas condições bem explícitas.
‘’O Caixa – Banco de Investimento, S.A. não preparou, analisou ou confirmou a informação prestada pelo Emitente.
Em conformidade, esta Nota Informativa não implica qualquer responsabilidade, compromisso ou garantia por parte do Caixa – Banco de Investimento, S.A., quanto à suficiência, veracidade, objectividade e actualidade do conteúdo da informação nela prestada pelo Entidade Emitente, nem envolve, por parte do Caixa – Banco de Investimento, S.A., qualquer avaliação ou juízo de valor quanto à situação económica e financeira da Entidade Emitente, à qualidade dos valores mobiliários que constituem o Programa, ou ainda quanto à oportunidade e validade do investimento nos mesmos, o que depende exclusivamente do critério dos Investidores.’’
Convém todavia saber que, no que respeita ao créditos contraídos directamente pelo BPN/PARVALOREM junto da CGD, o Estado Português é também, ao abrigo da Lei n.º 62-A/2008, o derradeiro garante de pagamento.
Ora então, o que é papel comercial? O ‘’site’’ oficial da Caixa Geral de Depósitos define desta maneira:
‘’PAPEL COMERCIAL
Uma fonte de financiamento de curto prazo disponível para as empresas
Designa-se por Papel Comercial os Títulos de crédito de curto prazo emitidos por sociedades comerciais ou civis sob a forma comercial, cooperativas, empresas públicas e demais pessoas coletivas de direito público ou privado, destinados a financiar défices de tesouraria mediante a emissão de Títulos nominativos, livremente negociáveis e domiciliados numa Instituição Financeira que preste o serviço da respetiva guarda.
Requisitos
Para a emissão de papel comercial, devem as entidades emitentes preencher um dos seguintes requisitos:
A exigência dos requisitos acima descritos não se aplica ao papel comercial cujo valor nominal unitário seja igual ou superior a € 50 000 ou o seu contravalor em euros, caso seja expresso em moeda diferente do euro.
As entidades emitentes ficam ainda obrigadas a elaborar uma nota informativa que tem por objeto a emissão ou o programa de emissão, contendo informação sobre a sua situação patrimonial, económica e financeira, da qual devem constar obrigatoriamente os elementos referidos no Artº 17º do D.L. 69/2004.
Prazos
O Papel Comercial é emitido por prazo inferior a 1 ano, sendo admitido o seu resgate antes do fim do prazo, nos termos previstos nas condições da emissão.
O Papel Comercial pode ser objeto de emissão simples ou, de acordo com o programa de emissão, contínua ou por séries.
Limites de emissão
As entidades emitentes de papel comercial, com exceção das instituições de crédito, das sociedades financeiras, das empresas de seguros e das sociedades gestoras de fundos de pensões, não podem obter, com a emissão deste tipo de valor mobiliário, recursos financeiros superiores ao triplo dos seus capitais próprios ou, no caso de entidades que não estejam sujeitas à adoção do plano oficial de contabilidade, ao triplo do seu património líquido.’’
Seja, pensamos que assim fica claro. A Caixa Geral de Depósitos não é no caso de uma emissão de papel comercial senão a instituição financeira onde são domiciliados títulos livremente negociáveis, competindo-lhe a respectiva guarda. O conceito de guarda integra, por norma, a promoção da venda dos títulos, a retalho ou por grosso, entre clientes e parceiros. Têm a mesma natureza os títulos do tesouro ou da dívida pública emitidos pelo Estado.
Vamos então confrontar estes dados com os relatórios de contas. Comecemos por consultar os resumos de ‘’balancete’’ constantes na página 75 do Relatório de 2012.
Em 2011 a PARVALOREM encerrara o exercício com mil e setecentos e vinte e nove milhões de ‘’outras contas a receber’’, seja, a fracção dos activos em carteira, créditos a cobrar ou património executado e em expectativa de retorno. Respondia todavia por um montante de crédito de dois mil e trezentos e vinte milhões de Euros decorrentes da emissão de títulos obrigacionistas.
Em 2012, a PARVALOREM apresentava já três mil e três milhões de ‘’contas a receber’’ e respondia por um crédito de três mil e trezentos e vinte e um milhões de Euros decorrente da emissão de títulos obrigacionistas, ou seja papel comercial.
Comparem-se com estes valores os resultados do exercício de 2012, que montam a quatrocentos e três milhões. Consulte-se também o quadro 32, na página 76, respeitante às Entidades Relacionadas, no que respeita à CGD. Nada consta de financiamentos directos da CGD a PARVALOREM.
Resumindo:
A PARVALOREM vai regularmente financiar-se ao mercado obrigacionista, duas emissões em 2013. Os relatórios de exercício, tanto o de 2011 como o de 2012, não permitem entender quais os propósitos dos financiamentos, pois não constam deles encargos liquidados durante esses períodos. Cifra-se de resto em escassos trezentos milhões de Euros, o movimento de balancete.
Do relatório de 2012 deduzir-se-ia a seguinte situação de balanço, expressa em linguagem sintáctica e simples:
A PARVALOREM tem um activo de valores a receber montante em três mil milhões de Euros. Administra um crédito obrigacionista de valor superior que estacionou inactivo em caixa, não se entende com que propósito.
Terá uma dívida de valor não calculado nem expresso para com a Caixa Geral de Depósitos. Mas não procede a qualquer amortização. Todos os seus movimentos se cifram em escassos trezentos milhões de Euros.
O que se deve deduzir disto?"
Sabemos que Nogueira Leite não tem deixado de alegar persistentemente, com toda a arrogância que lhe confere ser Presidente do Conselho de Administração de um império, a autonomia de PARVALOREM na administração dos negócios, activos e passivos, tanto de PARVALOREM com das restantes participadas na sua alçada. Bem como a propriedade exclusiva sobre o património adquirido no curso do processo de nacionalização e privatização do BPN.
Mas onde tem ido Nogueira Leite arregimentar os meios financeiros para todo esse carrossel de aquisições e alienações?
O Estado Português continua a ser o garante de todos os créditos que Nogueira Leite tem montado sobre o ‘’cavalo’’ da administração e recuperação dos créditos adquiridos ao BPN e suas participadas.
Vamos ver então como este ‘’esquema’’ funciona.
É para já relevante colocar uma questão. A PARVALOREM e os seus suportes da coligação governamental têm feito cavalo de batalha de consecutivas denúncias do papel do Banco de Portugal de Vítor Constâncio na supervisão do BPN de Oliveira e Costa. Mas que faz agora, perante este descalabro, o Banco de Portugal?